Há cerca de uma década, as mulheres da comunidade São José, no norte da Ilha do Marajó (PA), enfrentavam duras críticas ao se dedicarem ao extrativismo de murumuru, fruto de uma palmeira amazônica. O trabalho nas matas era motivo de zombarias por parte dos homens da região, que as chamavam de "loucas" por se embrenharem no mato. Além do esforço físico, enfrentavam o peso do preconceito e da desvalorização de seu trabalho.
“Quando nós começamos, foi muito difícil. A gente saía para o mato, deixava tudo em casa e ainda era criticada. Mas não ligamos e seguimos em frente”, lembra Benedita de Oliveira, uma das pioneiras. A extrativista Jesuína Batista Rosa também recorda dos apelidos pejorativos, como “mulheres fedorentas”, em referência ao cheiro forte do murumuru em fermentação.
Apesar do estigma, as mulheres descobriram que, por trás da polpa rejeitada, havia um tesouro: a semente do murumuru é altamente valorizada pela indústria cosmética, por suas propriedades hidratantes e emolientes. Essa descoberta transformou suas vidas e a visão da comunidade sobre o trabalho feminino.
O reconhecimento não veio de imediato. Mas, com o tempo, os frutos do trabalho começaram a aparecer – literalmente. A renda familiar aumentou, e os homens da comunidade aram a respeitar o esforço das mulheres. Antes disso, nenhuma delas tinha renda própria. A maioria se casou na adolescência e dedicava-se exclusivamente ao cuidado do lar.
A mudança começou com a atuação da Associação dos Trabalhadores Agroextrativistas da Ilha das Cinzas (Ataic), que incentivou a coleta de murumuru e ucuuba. Hoje, mesmo afastada da floresta por problemas de saúde, Lourdes Batista Silva se orgulha de ter sido uma das primeiras extrativistas do grupo Maniva, além de ter motivado outras mulheres a participar.
“Quando a gente começou a vender o murumuru, tudo mudou. ei a não depender de homem. Tenho orgulho da minha história”, conta Lourdes. Já Benedita relembra a realização de um sonho: “Consegui viajar de avião! Foi incrível. Agora conseguimos até essa casa aqui, nosso centro de produção.
O espaço citado por Benedita é o Centro de Produção das Mulheres do Maniva. Lá, elas processam as sementes colhidas: separam-nas da polpa na floresta, lavam no rio, secam em estufa, quebram e ensacam as amêndoas. O que antes era feito com martelo – e causava ferimentos – agora é facilitado por uma máquina doada ao grupo.
O grupo agora enfrenta um novo desafio: os efeitos das mudanças climáticas. “Nos últimos dois anos, a seca prejudicou muito a produção. Este ano, com mais chuvas, esperamos uma boa colheita”, relata Dionete. Mesmo diante das adversidades, elas seguem firmes, com esperança e determinação. “Se tiver algum obstáculo, a gente dá um jeitinho e continua”, conclui.
Mulheres extrativistas enfrentam preconceito e geram renda na Amazônia. 02 de junho, 2025. Redação/Metrópoles.